de profundis amamus
Ontem às onze
fumaste um cigarro
encontrei-te sentado
ficámos para perder
todos os teus eléctricos
os meus estavam perdidos
por natureza própria
Andámos
dez quilómetros a pé
ninguém nos viu passar
excepto claro os porteiros
é da natureza das coisas
ser-se visto pelos porteiros
Olha como só tu sabes olhar
a rua
os costumes
O Público
o vinco das tuas calças
está cheio de frio
e há quatro mil pessoas interessadas
nisso
Não faz mal
abracem-me os teus olhos
de extremo a extremo azuis
vai ser assim durante muito tempo
decorrerão muitos séculos antes de nós
mas não te importes
não te importes muito
nós só temos a ver
com o presente perfeito
corsários de olhos de gato intransponível
maravilhados maravilhosos únicos
nem pretérito nem futuro tem
o estranho verbo nosso
Mário Cesariny (1923-2006)
um adeus, eterno poeta...
Sem comentários:
Enviar um comentário