22 agosto 2008

escrita criativa 6

a noite já ia longa..
ela olhara para o relógio cerca de 3 vezes no espaço de vinte minutos, o que revelava ou ansiedade ou aborrecimento.
a coisa podia correr para os dois lados.
olhou em volta e no meio de copos vazios, restos do jantar improvisado, conversas que morriam juntamente com o resto dos ultimos cigarros que se extinguiam nos cinzeiros, corpos semi adormecidos atirados para todos os cantos da sala, e tentou encontrar o olhar dele no meio do fumo para lhe dizer "vamos embora?"
não surtiu efeito a tentativa de diálogo. "humm, o contacto visual é sobrevalorizado, realmente!", pensou com desdém, e num ultimo olhar em volta pensou que talvez fosse a única a sentir aquele sentimento crescente e pálpavel de estar além..
levantou-se, subiu para cima do sofá, deslizou até ao chão e enquanto caminhava até à porta balbuciou um "vou apanhar ar lá fora". espalmou as mãos de encontro ao vidro da porta e foi para o jardim.
foi já aí que se deu conta que se tinha esquecido do casaco em cima do sofá e que agora lhe faria imenso jeito. mas não lhe apetecia voltar a abrir a porta.

preferiu saborear o silêncio e a paz do jardim.. parecia ser o unico sitio onde parecia que não estava ninguém a nao ser ela e os pensamentos.
eis quando uma sombra se estende ao seu lado..
- desculpa, espero não te ter assustado.. -- diz-lhe uma voz macia.
- não, mas pensei que estava sozinha..
- humm.. mas porquê? preferias estar? vais fazer algo que eu não possa ver? -- retorquiu a mesma voz com um riso.
- quem sabe.. talvez me apeteça por-me aqui toda nua a dançar ao som do nithin sawnhey e tu estás aqui a mais.. ou então posso começar a falar sozinha e aí nesse caso, estarias igualmente a mais. -- responde-lhe abespinhada.
- já te disseram que tens um feitio tramado?
- já. por isso desde já não penses que me impressionaste com essa tua tirada de tão fraca originalidade.
- nesse caso talvez te deva informa igualmente que não me impressionaste minimamente com essa tua mania de mau feitio. acho que no fundo não és nada disso do que estás a tentar aparentar, e talvez estejas é com medo que eu me aperceba disso. -- pisca-lhe o olho.
- ok.. são 5 da manha e estou a ser analisada por um perfeito desconhecido no meio de um jardim..?? mas que idiotice.
agarrou no copo e senta-se no baloiço de madeira no fundo do jardim.
ele não deu a conversa como terminada.
- sabes, eu estava apenas a tentar ser cordial. é isso que as pessoas fazem numa festa.. metem conversa..
- pois mas talvez eu esteja farta do socialmente correcto. posso simplesmente não querer partilhar uma unica palavra contigo se isso me der na real gana. e se assim fôr, creio que estarei igualmente correcta. -- interrompe-o e levanta o olhar do copo só para lhe estudar a expressão.
inalteravel.. continuava ali especado e disposto em continuar a tecer uma conversa que até ao momento ela considerava como descabida. mas ainda não fora desta que o demovera.
- sabes.. -- disse ela para quebrar o silêncio -- talvez tenhas razão. eu ás vezes consigo ser muito.. como será a palavra? anti-social?
- também não creio que seja isso. talvez estejas assustada ou prefiras mesmo estar sozinha. se for o segundo caso eu acho que o que me suscita curiosidade é o porquê de tal escolha.. devo confessar. acho que és boa companhia, pelo menos esse teu feitio cativa.. -- conclui atirando uma gargalhada ao ar, o que lhe deixa a cabeça inclinada ligeiramente para trás.
é quando ela se apercebe que já o está a observar á tempo em demasia do que seria suposto.
- bom, está frio, acho que é melhor ir para dentro.
ficam apenas uns momentos a olhar um para o outro. ele fita-a de cima a baixo, e demora algum tempo a olhar-lhe para os pés que estão descalços em cima da relva.
- olha.. acho que te esqueceste de qualquer coisa, oh cinderela -- diz então em tom de gozo e já a olhá-la nos olhos.
ela baixou os olhos envergonhada, como se na nudez dos seus pés estivesse toda a nudez que alguma vez sentira.

encolheu os ombros, tentando não se dar por achada, fixou-lhe a boca e regressou à sala.