Fim do banco
«A idade vai comendo a vida. Vai ratando o futuro, e nós (eles) a verem. Acorda-se com um dia a menos, e adormece-se com um dia a mais.
O calendário vai-nos mudando o corpo. Vai-nos empurrando as costas, para a queda ser pequena. Os velhos sabem de cor o chão. Como quem sabe que está quase a chegar lá. Desde que perdi a minha avó, que ganhei o respeito por quem mora no terceiro andar da idade. Perde-se para ganhar. E assim foi. Emociona-me. Que vida inteira pode ser sentada sozinha, num banco de jardim?
Com a idade, nunca escolhem o meio, sempre o fim do banco. Em crianças, ter-se-iam sentado na outra ponta? E deixam-se estar. Respiram como podem.
Os olhos já não procuram nada. Já viram tudo. Vão guardando o passado em rugas, para libertar a cabeça. Em que pensam? Na morte?
Os velhos não vivem. Deixam-se viver.
Os filhos já tem a vida deles, não os querem. Tem de ir viajar e fazer compras para o jantar.
"O pai tem estado bem? Então vá, um beijinho."
Picaram o ponto, e para eles está feito. Os novos choram com o corpo todo, gritam e fazem caras de quem sofre. Os velhos choram só com os olhos, que o resto não se vê. E assim o fazem, no fim do telefonema.
Ninguém os quer com as doenças cheias de idade. As mãos da idade cheiram a tudo, com as veias cansadas de mostrar o sangue a toda a gente. As pernas vão perdendo caminho. Os braços deixam de abraçar. O coração começa a falhar, já bateu demais mesmo para quem amou pouco. Vai-se esquecendo de bater.
E uma noite, sem avisar, desaprende.
Desliga os olhos e atira o corpo para o fim.
Ocupam agora o banco todo.Do principio ao fim, todo ele é corpo.
E os filhos, cansados de telefonar, resmungam. Morreram oitenta e dois anos, e nem mais um dia. A cidade não pára, o mundo não interrompe, nada. Os filhos enterram vinte anos, e guardam os outros sessenta e dois.
Os últimos vinte davam trabalho e de pouco valiam. Não tem vagar para os guardar. Mas de hoje em diante, esses vinte vão acordá-los todos os dias. Até se deitarem sozinhos no banco que os vai deitar.»
texto de Bruno Nogueira
quando li este texto estas palavras fizeram-me pensar em muitas coisas e reavaliar outras tantas..
o tempo passa realmente demasiado depressa e nem sempre temos o tempo preciso pra dizer as palavras.. aquelas palavras não pensadas mas sinceramente sentidas.
a vida já roubou oportunidades de dizer umas quantas.. e este texto tocou fundo.
«A idade vai comendo a vida. Vai ratando o futuro, e nós (eles) a verem. Acorda-se com um dia a menos, e adormece-se com um dia a mais.
O calendário vai-nos mudando o corpo. Vai-nos empurrando as costas, para a queda ser pequena. Os velhos sabem de cor o chão. Como quem sabe que está quase a chegar lá. Desde que perdi a minha avó, que ganhei o respeito por quem mora no terceiro andar da idade. Perde-se para ganhar. E assim foi. Emociona-me. Que vida inteira pode ser sentada sozinha, num banco de jardim?
Com a idade, nunca escolhem o meio, sempre o fim do banco. Em crianças, ter-se-iam sentado na outra ponta? E deixam-se estar. Respiram como podem.
Os olhos já não procuram nada. Já viram tudo. Vão guardando o passado em rugas, para libertar a cabeça. Em que pensam? Na morte?
Os velhos não vivem. Deixam-se viver.
Os filhos já tem a vida deles, não os querem. Tem de ir viajar e fazer compras para o jantar.
"O pai tem estado bem? Então vá, um beijinho."
Picaram o ponto, e para eles está feito. Os novos choram com o corpo todo, gritam e fazem caras de quem sofre. Os velhos choram só com os olhos, que o resto não se vê. E assim o fazem, no fim do telefonema.
Ninguém os quer com as doenças cheias de idade. As mãos da idade cheiram a tudo, com as veias cansadas de mostrar o sangue a toda a gente. As pernas vão perdendo caminho. Os braços deixam de abraçar. O coração começa a falhar, já bateu demais mesmo para quem amou pouco. Vai-se esquecendo de bater.
E uma noite, sem avisar, desaprende.
Desliga os olhos e atira o corpo para o fim.
Ocupam agora o banco todo.Do principio ao fim, todo ele é corpo.
E os filhos, cansados de telefonar, resmungam. Morreram oitenta e dois anos, e nem mais um dia. A cidade não pára, o mundo não interrompe, nada. Os filhos enterram vinte anos, e guardam os outros sessenta e dois.
Os últimos vinte davam trabalho e de pouco valiam. Não tem vagar para os guardar. Mas de hoje em diante, esses vinte vão acordá-los todos os dias. Até se deitarem sozinhos no banco que os vai deitar.»
texto de Bruno Nogueira
quando li este texto estas palavras fizeram-me pensar em muitas coisas e reavaliar outras tantas..
o tempo passa realmente demasiado depressa e nem sempre temos o tempo preciso pra dizer as palavras.. aquelas palavras não pensadas mas sinceramente sentidas.
a vida já roubou oportunidades de dizer umas quantas.. e este texto tocou fundo.
ao meu avô a quem vou já agora dar aquele abraço.
(ninguém tem mais pausa que o meu avô!) :)
e quem puder que vá abraçar os seus avós.. agora!
:)
dia 25 de julho é o dia dos avós.. mas devia ser todos os dias, ou não?
e quem puder que vá abraçar os seus avós.. agora!
:)
dia 25 de julho é o dia dos avós.. mas devia ser todos os dias, ou não?
2 comentários:
Infelizmente já não tenho os meus dois avôs comigo...
Um lado sensível teu aqui exposto?!! Espanta-me ;-)
Estou a brincar e tu sabes!!!
Beijox
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