17 julho 2008

escrita criativa 2

"tudo dá uma história" disse-lhe ele enquanto sorria. ela fixou-lhe as feições.. deixou o olhar passear-lhe pela cara até se fixar na pequena cicatriz do queixo enquanto esperou pelo beijo da despedida que a acompanharia até à porta de casa.
"até amanhã, dorme bem.."
pelo caminho vai-se lembrando quando saiu de casa numa noite semelhante àquela.
a noite estava mais que fria e isso fê-la levar a apertar contra si umas quantas vezes durante o percurso o casacão de lã grossa que tinha escolhido vestir. antes de sair de casa olhara-se ao espelho mais do que o habitual, na tentativa de prever o que ele veria quando a visse.
ao chegar ao local marcado olhou em volta.. não parecia que ele lá estivesse ainda.. não tardou a reconhecer-lhe as feições enquanto o via caminhar na sua direcção passados poucos instantes.
ambos esboçaram sorrisos meio nervosos/meio controlados de quem não sabe ao certo o que esperar do outro e não quer dizer nenhuma asneira que estrague a tal da primeira impressão que não se volta a repetir para que possa ser corrigida.
sim, essa noite estava realmente gelada, não havia quase ninguém nas ruas, mas eles não tinham destino e por isso todos os caminhos lhes pertenciam.
um táxi parado do outro lado da rua pareceu-lhes convidativo. "praonde é a ida?" pergunta a voz do banco da frente. "olhe.. leve-nos para qualquer sitio onde esteja quente e.. humm.. vá seguindo por ai já lhe dizemos quando surgir uma ideia". riram-se.
claramente o nervoso ainda lá estava mas não estavam já tão preocupados com as formalidades.. durante o caminho algumas vezes os olhares se encontraram.. ela pensava coisas e ele outras tantas.
chegados ao local perderam-se em conversas, copos, olhares, meias frases, e com o cair das horas foi-se instalando a sensação de familiaridade.
o voar do tempo levou-os a pensar no regresso a casa.
a noite continuava gelada.. mas talvez algo tivesse injustificavelmente mudado.
caminharam até à praça de táxis mais próxima. durante o caminho ela pensou beijá-lo. demasiado cedo? ela costumava pensar que sim.. mas não lhe apetecia deixar que ele se fosse embora, mas também não sabia como lhe mostrar para ficar.
o táxi já estava parado á espera.. lá dentro o velho condutor esfregava incessantemente as mãos para espantar o frio. abriram a porta e responderam à pergunta do costume "então praonde é a corrida?". destino escolhido, arrancaram.
a viagem de regresso foi rápida. as luzes de natal que enfeitavam ainda esquecidas a cidade iam deixando para trás um rasto de feixes de luzes coloridas que lhes dançavam nos olhos.
enquanto o táxi seguia velozmente pelo alcatrão ela encostou-se mais a ele e pousou-lhe a cabeça no ombro.. chegou a fexar os olhos algumas vezes.. ele cheirava bem. a certeza que o queria beijar começou a surgir-lhe cada vez mais no pensamento. e não era o alcool a falar.
finalmente o táxi pára. ele sai primeiro e ela desliza em seguida pelo banco preto de napa.
estao os dois frente a frente, apetece-lhes rir.. "bom, é agora.. parece que temos de nos despedir".. antes de o deixar pronunciar mais uma palavra ela põe-se em bicos de pés e passa-lhe a mão no pescoço e beijam-se.

fecha os olhos.. tudo aquilo lhe sabe demasiadamente bem.. como um shot que lhe bate sem aviso.
se daqui começa uma história de amor, cabe imaginar..
de facto tudo dá uma história.


«She was alone for so long that her heart built a wall
and all who tried to get in couldn't even go near
Yet deep inside that fortress
was a lost little girl crying out to be seen and to love tenderly
He had journeyed so far no one's foul would he be
and every moment he swore that his heart would stay free
Yet deep inside that wanderer
was a lost little boy crying out to be seen and to love tenderly»

1 comentário:

Anónimo disse...

é uma bela historia...conta outra vez!