13 abril 2011

eternamente hoje

de tudo o que me faz pensar há uma coisa que me atropela a cabeça: a idade. não a minha, mas a deles.
posso tê-los agora, e abraçá-los com a carne que me deram, mas e depois? vejo-lhes os anos na pele e a pele dá-me saudades. saudades do que não vou ter.
é a lei da vida
, bem o sei, e é o que todos dizem assim como todas as frases feitas que pregarem nas paredes.
eu sei que o é. mas visto daqui, dos meus olhos, não envelheceram.
quero lembrar o meu avô a ficar envergonhado quando balbucia no seu jeito acanhado um "gosto muito de ti filha, agora vai lá indo pra cima antes que fique escuro", eu lhe dou um beijo na testa e me cabe a mim agora a tarefa de lhe compôr a manta pra que não passe frio; e chego ao fundo do corredor, abro a porta e olho pra trás mais uma vez e o vejo lá ao longe.. e lhe aceno do lado de cá, fechando depois a porta e suspirando fundo pra espantar as lágrimas.
tenho eternas saudades da minha avó quando dizia com gotas de amor a marcar passo nos olhos "gosto muito de ti sofya, nunca te esqueças disso". -- nunca te esqueças disso.. e eu não esqueci.
as memórias não são de carne, são de lágrimas.. e essas custam mais a abraçar.a palavra neto é patente deles. -- quando a dizem é como se uma manta nos protegesse o coração até cima. depois fica só o coração e a manta enrolada aos pés.podemos sempre puxá-la, mas nunca mais vai tapar tudo.
há qualquer coisa que rasga cá dentro, eu bem disse.
e não, nunca me esquecerei disso.
o estármos todos juntos numa mesma casa era o tempo em que se era feliz e não se tinha essa noção. nem sequer paravamos pra pensar o que era isso da felicidade, porque éramos demasiado pequenos pra o entender, mas essa sensação feliz de calor humano, de uma casa cheia e estórias do mundo dos adultos e do mundo dos livros que nos pasmavam e faziam sonhar foi um tempo que se cristalizou pra sempre.
com o passar do tempo aos poucos a casa foi ficando vazia.. as crianças que éramos deixaram de existir porque o tempo passou e de repente já somos adultos também.
e as mesmas estórias ficam guardadas pra sempre na nossa memória.
e tudo isso dá lugar á saudade, mesmo que as mesmas estórias possam ser revisitadas num abrir de album de fotografias, numa recordação breve de um episódio qualquer 'tu-lembraste-quando-um-dia..'



apetece deixar cair uma pedra na roda dentada e parar tudo.
a assobiar, para não ter de prestar contas.